quarta-feira, 6 de abril de 2011

Correlações Anatomoclínicas da Medula Espinal

            A medula espinhal pode ser lesada de várias maneiras, produzindo vários padrões de sintomas. Esses padrões permitem ao médico determinar a localização (o nível) da lesão, baseado na anatomia da medula, que vimos no post anterior. A medula espinhal pode ser seccionada em um acidente, comprimida, destruída por uma infecção, lesada quando o seu suprimento sangüíneo é interrompido ou afetada por doenças, como na formação de um cisto, espondilose ou esclerose múltipla, que alteram a função nervosa.

            O trato corticoespinal é um trato de ação inibitória, que atua sobre os motoneurônios alfa da medula espinal. Portanto, uma lesão que acometa este trato é caracterizada por perda ou diminuição do movimento voluntário e sinais de liberação piramidal, como aumento do tônus muscular, hiper-reflexia, clônus, reflexo plantar superficial anormal (sinal de Babinski), que juntos configuram os sinais de neurônio motor superior. Estes sinais ocorrem ipsilateralmente e abaixo do nível da lesão.
            Quando a lesão acomete os nervos periféricos, ou o corno anterior da medula, aparecem os sinais do neurônio motor inferior: perda ou diminuição dos movimentos voluntários, diminuição do tônus muscular, hipo ou arreflexia, fibrilações e fasciculações, e atrofia muscular. Estes sinais ocorrem ipsilateralmente, no miótomo afetado.
            Também podem ser acometidas estruturas sensitivas, levando a sinais sensitivos. Estes sinais respeitam a anatomia da medula, que apresenta cada trato transportando uma informação específica aos centros superiores.
Assim, os sinais do funículo posterior são perda de sensibilidade vibratória, sentido de posição e tato profundo, ocorrendo ipsilateralmente, no nível e abaixo da lesão; os sinais do trato espinotalâmico lateral ocorrem quando este trato é acometido, e é caracterizado por perda ou diminuição de sensibilidade dolorosa e térmica contralateral à lesão, um ou dois segmentos abaixo da lesão.
            Outras síndromes são a do cone medular e da cauda eqüina, que hoje vêm sendo tratadas como se fossem uma mesma síndrome, caracterizada por disfunções esfinctéricas e sexuais (ereção e ejaculação), que também segue as regras da anatomia medular.
            Ou seja, a medula lesada irá apresentar diversos sinais, motores e/ou sensitivos, que são de fácil entendimento quando se conhece sua anatomia, com seus tratos e níveis de cruzamentos (reveja o post anterior). Partindo destes preceitos, sabemos o que esperar de um paciente com Síndrome Brown-Sequard (hemisecção medular), por exemplo.

            Mas sabendo-se de tudo isso, por que é tão difícil determinar o prognóstico exato de uma paciente com lesão medular logo após a lesão? Um dos motivos é a condição de “choque medular”, onde as manifestações imediatas (2 a 3 semanas) à lesão dificultam a determinação do prognóstico.
Estas manifestações são sensitivas, com perda de todas as sensibilidades, bilateralmente, ao nível e abaixo da lesão; e motoras, com uma paralisia flácida ao nível e abaixo da lesão. Esta paralisia flácida torna-se espástica na faze tardia, devido à liberação de reflexos segmentares.
            A função vesical fica prejudicada, com perda de função voluntária e reflexa imediata, com posterior desenvolvimento de esvaziamento automático da bexiga. O mesmo ocorre na função intestinal.
            As funções sexuais erétil e ejaculatória também são perdidas inicialmente, sendo retomadas reflexamente. Na mulher pode ocorre interrupção temporária da menstruação e irregularidades no ciclo menstrual.
            Somente após este período de choque que pode-se avaliar de maneira mais efetiva os comprometimentos causados pela lesão. Ainda assim, podem ocorrer melhoras (recuperação de funções) meses após a lesão.

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